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Editor de livros: carreira e a importância da capacitação

A literatura como negócio: uma perspectiva do editor e professor, Alexandre Fonseca

Publicado em
10/01/2025 18:58

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A literatura como negócio: uma perspectiva do editor e professor, Alexandre Fonseca

Uma criança cercada de livros. É assim que muitas pessoas imaginam a infância de um editor de livros, alguém que se dedica a publicar obras que façam a diferença na vida dos leitores. Mas, nem sempre isso é real.

Sócio da editora Perspectiva, onde também atua como diretor comercial, administrativo e financeiro, na infância, Alexandre Fonseca não tinha livros em casa, contrariando a fantasia criada por muitos.

Fonseca também não veio de uma família rica, derrubando mais um estereótipo sobre os editores. Mesmo assim, fez dos livros um negócio e construiu uma carreira nesse mercado, atuando como vendedor, consultor e, claro, editor.

O profissional é um dos professores do “Curso de Formação de Editores de Livros”, oferecido pelo Sebrae Minas dentro do programa “Meu Negócio é Literatura”, criado para qualificar interessados em trabalhar na área.

Nesta entrevista, Fonseca fala sobre o trabalho de um editor, pontua alguns momentos da trajetória profissional e destaca o poder de transformação do livro para pessoas e comunidades.

Sebrae – Muitas pessoas imaginam o editor como alguém rodeado de livros desde a infância, mas com você não foi assim. Como foi o seu primeiro contato com os livros?

Alexandre Fonseca – Existem muitas fantasias sobre os editores de livros e algumas passam por isso, pensando na infância desses profissionais como devoradores de livros desde sempre. Mas, de fato, a minha história não conversa com isso.

Antes dos livros, eu tive contato com a leitura. A minha mãe, uma pessoa simples, trazia os jornais todos os dias do trabalho dela e deixava para que eu lesse. Quando chegava, ela perguntava sobre as notícias e eu contava o que tinha me chamado atenção, o que era mais importante.

Então, o que eu tenho muito forte comigo é essa base de leitura de jornal antes dos livros, porque, na minha casa, nós não tínhamos acesso por falta de grana mesmo. É até difícil falar o que é o ovo e a galinha, o que veio primeiro: se a falta de dinheiro ou se, realmente, não havia o hábito.

O primeiro contato com livro que eu lembro foi na escola. Eu tive a felicidade de estar em uma escola que tinha uma biblioteca, como praticamente toda escola pública tem. Digo praticamente, porque, infelizmente, algumas bibliotecas não têm muitos livros. Até outro dia, vi um dado que mostra que algumas escolas não têm biblioteca, o que é uma loucura, porque a lei diz para ter.

Eu lembro que havia uma bibliotecária muito legal. Era uma biblioteca que ninguém visitava na escola, mas eu era um jovem introvertido e era um lugar bom para ficar. Ela foi me apresentando livros. Alguns que me marcaram foram os do Ziraldo e a série “Vagalume”, títulos juvenis da época bastante importantes e que marcaram a vida de uma geração.

Daí em diante, eu passei a ler livros, mas sempre os dos outros, nunca os meus, porque não havia livros em casa e não tínhamos dinheiro para comprar.

Sebrae – Apesar de não haver livros na sua casa, sua mãe dava muito valor para a educação, não?

Fonseca – Tanto minha mãe quanto minha avó. Especialmente a minha mãe tinha um pouco mais de consciência sobre o papel da educação no meu futuro.

Em casa, tinha algo bem claro: diziam que eu tinha a chance de alcançar coisas melhores e que não havia meio de fazer isso sem muito trabalho e muito estudo. Mesmo com pouca educação formal, minha mãe tinha muito essa consciência de que a educação ia me abrir o mundo e possibilidades. Essa fala veio dela.

Nós ouvimos muito um certo discurso vazio de alguns falando isso, mas era muito real vindo da minha mãe. Ela entendia que, se eu tinha uma chance na vida, era através da educação.

Sebrae – Inicialmente, essa descoberta dos livros não te fez querer fazer disso uma carreira. É verdade que você queria ser político?

Fonseca - Quando eu comecei a ler livros de não ficção, saindo da literatura infantil e juvenil, me interessei mais pelos temas que nos rodeavam. Sempre fui muito curioso e queria entender o porquê das coisas.

Comecei a imaginar ou fantasiar, em um certo sentido, que a política poderia ser o meio de ajudar a transformar a vida das pessoas que eu conhecia. Melhorar a minha própria vida, mas também da minha avó, minha mãe e de todo o bairro.

Em um dado momento, eu decido pela faculdade de ciências sociais, queria me capacitar para ser um político melhor. Mas, eu começo a fazer o curso e ter contato com uma política não só teórica, mas prática também, e a fantasia começa a cair para uma realidade que não me agradou muito.

Sebrae – E como você começou a trabalhar com livros?

Fonseca – Eu precisava de grana para sobrevivência mesmo. Já namorava e queria sair para comer e ir ao cinema, coisas simples. Ter uma casa própria e viajar pelo mundo ainda não eram questões, mas sim ter dinheiro para convidar a namorada para sair e pagar o lanche.

Eu trabalhava em um cursinho pré-vestibular em troca de uma bolsa de estudos, porque queria entrar na USP (Universidade de São Paulo). Foi lá que conheci a minha esposa.

Nesse processo, eu tinha um amigo que foi trabalhar em uma livraria e dizia que o trabalho por lá estava superlegal. Era uma livraria que eu já tinha visitado algumas vezes para meio que aproveitar a leitura de graça, era a minha biblioteca. Era uma grande livraria de São Paulo, que chamava Ática Shopping Cultural.

Quando abriram vagas, eu me inscrevi e tive a felicidade de começar a trabalhar lá e, muito rapidamente, percebi que o vendedor de livros fazia muita diferença na vida das pessoas, que chegavam lá cansadas do dia a dia, machucadas por alguma questão, interessadas em se desenvolver e tinha um livro para cada uma delas.

Era muito interessante como, de fato, você via o poder daquilo, o vendedor de livros como um agente social. Eu pensei: “caramba, isso não é brincadeira, é muito legal”.

Mas, eu ainda não tinha aquilo como carreira. Estava fazendo faculdade e fui tocando o curso no interim. Fui convidado para trabalhar em outra livraria e aí comecei a me encantar mais, perceber que poderia ser uma profissão.

Como o meu interesse por política já estava em baixa, juntei as duas coisas e encarei que isso era uma carreira, que fazia sentido me dedicar ao máximo ao ela. E aí, desencanei de ser político.

Sebrae – Considerando a experiência que você acumulou depois disso, em livrarias e editoras, como define o trabalho de um editor de livros?

Fonseca - Mesmo na complexidade atual daquilo que eu chamo de cadeia do livro, com os entes dessa cadeia tendo papéis múltiplos, eu diria que o editor, o bom editor, se mantém fazendo o mesmo que os primeiros editores de livros faziam.

Primeiro, prospectando obras que ele entende como relevantes para determinada área do conhecimento ou entretenimento, de um gênero e tudo mais. E, também, se dedicar a fazer com que o conteúdo seja apresentado da melhor maneira, desde os cuidados básicos, como: ter uma boa tradução, se for um livro traduzido; uma boa revisão de texto, de gramática e de coerência; e uma boa definição de projeto gráfico para que o livro seja agradável de ler e desejável nas livrarias.

Por fim, o editor também promove o contato das pessoas com o entendimento de que o livro é interessante, importante e que pode ser legal para cada um dos interessados.

Eu entendo que o papel do editor é muito simples de ser definido, mas a característica que eu acho mais relevante para um bom editor é fazer os livros que acredite, que realmente podem agregar algum valor para as pessoas, seja na diversão ou no conhecimento.

Algumas pessoas querem editar livros buscando o que vai vender muito. É óbvio que é importante vender, até para chegar ao maior número de pessoas possível, mas o bom editor ainda é aquele que acredita nos livros que faz, trabalha com esmero e cuidado para que seja o melhor produto possível.

Sebrae – Ainda existe uma ideia de que o editor precisa ser rico para começar na carreira. Por que é importante superar esse estereótipo?

Fonseca – Eu gosto e acho necessário quebrar essa fantasia, esse estereótipo, de que, para ser editor, tem que ser rico. Pensar que isso não é para você se você não for rico é uma bobagem, ainda mais nos tempos atuais.

Falamos muito do que piorou, mas muitas coisas melhoraram ao longo do tempo. A tecnologia trouxe possibilidades que envolvem desde a produção efetiva do livro, produção gráfica, editorial, impressão e softwares.

Mas, hoje, ser um editor independente é super possível para todo mundo que se dedique a fazer um bom plano de negócios, tenha clareza sobre o perfil dos livros que quer editar, estude e corra atrás do entendimento de como funciona esse mercado.

Não há mais uma barreira que envolva um grande investimento. Dá para começar pequenininho e ir galgando espaço até se consolidar como um editor relevante em alguma área.

Claro, se olharmos para o ponto de vista histórico, era muito mais comum, daí a razão do estereótipo, que os grandes editores de outros tempos fossem pessoas ricas. Entendo que, lá atrás, isso fosse uma realidade que combinava a educação formal, que essas pessoas tinham mais acesso, e as condições de se enveredarem pelo mundo cultural. O próprio investimento inicial era mais complexo.

Hoje, também tomando cuidado para não parecer simples demais, um autor pode se autopublicar e um editor que nasce independente pode utilizar uma plataforma de crowdfunding (financiamento coletivo) para começar um projeto, até com o dinheiro dos próprios leitores.

Há inúmeras possibilidades que não existiam antes. Lá atrás, pode ser que isso fosse real, mas agora não. Por favor, não vamos usar esse autolimite e estabelecer que isso não é para nós. Se você acredita que tem vocação, estude, porque é possível sim.

Sebrae – Nas suas aulas, você fala da importância de encarar o livro como um negócio. Por que?

Fonseca – Nós falamos da fantasia do “isso não é para mim, porque eu não sou rico”, mas, do outro lado, também há uma forte glamorização do livro como um negócio sobre o qual você não precisa pensar muito, como se a cultura se sustentasse simplesmente pelos seus conteúdos. Mas, não. É um negócio e me preocupo muito com isso.

Vejo que é relativamente natural que muitos estudantes de Humanas e Letras, por exemplo, eventualmente de artes, dizem que é muito legal ser editor, lidar com autores e ler livros o dia inteiro.

As pessoas ficam sempre com esse registro e precisamos lembrar que é preciso equilibrar. Claro, tudo isso faz parte do dia a dia. A satisfação e o prazer de ter oportunidade desse relacionar com grandes autores, assim como o contato com bons textos, é muito legal, mas não para em pé.

Você precisa planejar bem; estruturar; ter o entendimento do contexto de mercado e de como funcionam as práticas; estabelecer políticas e estratégias. É um negócio como outro qualquer.

Às vezes, alguns alunos se queixam, porque, de alguma maneira, quando eu falo disso, eles estão na glamorização e os levo para o outro polo. Quero que eles encontrem o caminho do meio.

Sebrae – Você destaca nas aulas características gerais de um empreendedor que também são importantes para quem deseja trabalhar como editor. Quais são as principais?

Fonseca – Tem alguns conceitos que usamos muito mal e estão na boca das pessoas, como a resiliência, por exemplo, mas que eu verdadeiramente acredito como sendo algo importante para todo e qualquer empreendedor. No livro, não é diferente.

Do meu ponto de vista, a resiliência transcende a questão de saber lidar com dificuldades e tem um misto de comprometimento, insistência e de se manter confiante de que é possível e que certas situações podem ser revertidas.

Como outros mercados, o livro vive momentos cíclicos, de melhores e piores momentos, e temos que saber lidar com isso planejando e proativamente se preparando. Mas, às vezes, quando surpreendido, não achar que esse problema só ocorre com você.

O empreendedor é aquele que tem que se lançar para algo que ele acredita, que vai trabalhar para acontecer e essa resiliência tem que ser muito potente na base de todo e qualquer empreendedor.

Outra característica que eu sempre gosto de lembrar é a questão da visão. Você tem que ter muito claro qual o seu objetivo principal do negócio, o perfil editorial escolhido e aonde você quer chegar.

A partir disso, fica muito mais fácil fazer o planejamento e concatenar todas as ações. É preciso corres atrás, se preparar, conhecer sistemas, pessoas, empresas e fornecedores antes de dar os próximos passos.

Sebrae – É possível destacarmos os principais desafios e oportunidades desse mercado?

Fonseca – Tudo depende muito do perfil do negócio e dos alvos que você estabelece, porque, geralmente, é óbvio que alguns avanços tecnológicos poderiam ser entendidos como ameaças. Mas, algumas ameaças aparentes ou, de fato, reais podem virar super oportunidades se você estabelecer estratégias para lidar com elas.

Tem se discutido muito, por exemplo, o papel da inteligência artificial no nosso mercado, que tem sido muito impactado pelo debate de que essa tecnologia vai tirar trabalho de certas pessoas e, se bobear, substituir os próprios editores.

No final das contas, fora o que eu posso dizer como uma falácia ou algo que não nos leva a lugar nenhum, esse é o tipo de exemplo de avanço tecnológico que cabe menos a mim avaliar se é bom ou ruim e mais perceber que ele já está na nossa realidade.

Por fazer parte do dia a dia, tenho que entender quais são as possibilidades, que ferramentas oriundas de inteligência artificial podem auxiliar no meu negócio.

Então, hoje, eu não estou com a cabeça em substituir pessoas por ferramentas de inteligência artificial, mas sim em entender qual processo editorial pode ser agilizado ou melhorado.

O que estou fazendo é estudar sobre isso para transformar uma aparente ameaça em uma oportunidade, porque, ao estudar, percebo que há coisas que vão salvar minutos do dia que podem ser utilizados em questões criativas.

Esse, para mim, é o maior exemplo de ameaças, oportunidades e da maneira que eu gosto de lidar com elas, que sempre sugiro para os alunos. Aliás, essa é uma característica de um bom empreendedor: não ficar na superfície, aprofundar.

Sebrae – Até porque a tecnologia facilitou muitos processos, não?

Fonseca – A tecnologia tem ajudado a possibilitar a entrada de pessoas que, antes, precisariam ter um time grande de profissionais, uma qualificação enorme, um investimento inicial grande e, hoje, não.

Eu vejo, para os entrantes nesse mercado, grandes oportunidades por conta dos avanços tecnológicos. Há dez anos, para fazer um livro impresso, você tinha que imprimir mil exemplares, no mínimo, ou ele nem saía da gráfica. A gráfica não aceitava o trabalho, era um tipo de impressão que chamávamos de offset.

Hoje em dia, você imprime digital e pode fazer apenas um, depois que a venda já foi feita, que é a impressão sob demanda. Você pode imprimir poucas quantidades, com preços razoáveis e com uma boa condição de qualidade.

Então, os avanços tecnológicos têm nos ajudado muito, apesar de ver com certa preocupação a falta de regulação e a falta de debate ético sobre alguns usos. Isso me preocupa, mas, no geral, eu vejo que o nosso momento é de ebulição positiva para os entrantes no mercado do livro, porque há muitas ferramentas e possibilidades que antes não tínhamos.

Sebrae – Além da formação, um editor de livros também precisa se manter constantemente atualizado sobre o mercado, certo?

Fonseca – Desde a primeira aula, em que trago dados e números, uma das minhas preocupações é deixar registrado que, além dessas informações sobre o panorama do mercado, é muito importante que os empreendedores estejam inteirados sobre todas as novidades e aquilo que os rodeia, deixando de olhar somente para a realidade deles.

Eu também acho que outra característica importante do empreendedor é não achar que fazer um curso de formação de editor resolve tudo para abrir e lidar com o negócio. O lidar com o negócio é continuar aprendendo, porque o mundo está em constante evolução e, se você não está conectado com as novidades e não entende o mercado, vai ter dificuldades.

O empreendedor é aquele que tem que buscar conhecimento incessantemente. Nosso mercado também é muito relacional, então, outra dica que eu sempre dou é fazer parte de grupos de WhatsApp e redes sociais, como o grupo que fizemos desse curso.

É um mercado relativamente pequeno, as pessoas se conhecem muito pelos nomes. Então, mesmo que os caminhos sejam trilhados de maneiras diferentes, manter contato o máximo possível é muito rico e importante no nosso meio.

Sebrae – Tanto o trabalho de editor quanto o livro em si podem ser agentes de transformação de pessoas e comunidades?

Fonseca - Eu não quero parecer incoerente quando eu me esforço, nas minhas aulas, para que os alunos encarem o livro como um negócio, mas eu super acredito que também é muito mais do que isso.

É importante se instrumentalizar sobre as coisas típicas de um negócio, como planejar, medir, estabelecer estratégias, ter sistemas e números, mas é fundamental que não percamos a noção básica do que o livro pode fazer em uma sociedade tão carente como a do Brasil e não estou nem falando de dinheiro, mas, também de educação, conhecimento e outros elementos.

O próprio livro é um instrumento de transformação. Nós, como editores, que estamos trabalhando para fazer os melhores livros possíveis, temos que ter clara a premissa do porquê fazemos aquilo.

Então, se não for fazer o livro para melhorar a vida das pessoas, pode parar e arrumar outra coisa para fazer.

O livro, por excelência, é um agente de transformação e uma sociedade como a nossa necessita disso. Junto com a educação, o livro tem esse papel fundamental. Não percamos isso de vista.

Quer investir nesse mercado e se tornar um editor de livros? Então, acesse a página do nosso curso, conheça a programação e se qualifique para dar os primeiros passos nesse mercado.

Dúvidas? Fale com um de nossos especialistas no Atendimento Online, ligue para nossa Central de Atendimento no telefone 0800 570 0800 ou visite a Agência de Atendimento mais próxima.

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